Como Rio Paraibuna deixou de ser o ‘point’ de diversão em Juiz de Fora após aumento da poluição


Com o crescimento da cidade e a industrialização, o Rio Paraibuna destacou pelo potencial hídrico, o que levou à degradação e ao aumento da poluição. Pesquisas recentes da UFJF identificaram metais pesados e medicamentos nas águas. Rio Paraibuna, em Juiz de Fora
Juliana Netto/g1
No sábado (22), foi comemorado o Dia Mundial da Água, e o g1 contou a história da relação do Rio Paraibuna com a formação da cidade de Juiz de Fora, além de como a população utilizava a água para a prática de esportes, lazer, com a prainha em Chapéu D’Uvas, pesca e navegação.
Contudo, esse cenário mudou drasticamente com o desenvolvimento industrial na cidade, o que resultou no que muitos chamam de ‘morte’ do principal curso d’água. Até hoje, ele ainda passa por um processo de despoluição.
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Na época, com o crescimento da cidade e a industrialização, o Rio Paraibuna se destacou pelo potencial hídrico. Idealizada pelo industrial Bernardo Mascarenhas, a primeira usina hidrelétrica da América do Sul, chamada Marmelos, foi inaugurada em 1889.
“A construção desta usina permitiu que Juiz de Fora tivesse um considerável desenvolvimento industrial e ficasse conhecida como a Manchester Mineira”, explicou o vice-presidente do Comitê da Bacia Hidrográfica dos Rios Preto e Paraibuna, Wilson Acácio.
Primeira Usina Hidrelétrica da América do Sul inaugurada em 1889
Acervo Simón Eugénio Sáenz Arévalo
Entre as décadas de 1940 e 1960, o desenvolvimento industrial foi intenso, levando ao crescimento populacional em grande escala e desordenado, atraindo pessoas de diversas cidades da Zona da Mata e até de outras regiões mineiras, além de outros estados.
A energia elétrica impulsionou a industrialização da região. No fim do século XIX, Juiz de Fora já contava com 20 indústrias, destacando o setor têxtil. Contudo, com essa industrialização, iniciou ‘a morte do Rio Paraibuna’.
O vice-presidente da bacia destacou que esse processo aumentou significativamente a geração de lixo, esgoto doméstico e industrial.
“Ressalta-se que o serviço de limpeza urbana era totalmente inadequado e não existia tratamento para os efluentes líquidos das residências e também das indústrias”, acrescentou Wilson Acácio.
Para ele, esse quadro piorou nos anos seguintes. “As águas do Rio Paraibuna se tornaram um esgoto ao ar livre. A junção de todos esses fatores contribuiu para que as águas do nosso rio se tornassem impróprias para usos múltiplos, o que persiste até hoje”, completou.
Metais pesados e medicamentos no rio
Há décadas, a sujeira exposta no Paraibuna já alerta para o alto índice de poluição do rio, mas as substâncias presentes no curso d’água, que não são visíveis a olho nu, também despertam preocupação. Entre as encontradas estão os metais pesados provenientes das indústrias e os medicamentos que chegam através do esgoto sem tratamento.
Uma pesquisa de mestrado da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF) revelou concentrações de metais pesados, como zinco, cádmio e chumbo, bem acima dos limites estabelecidos pela legislação em trechos do rio.
O estudo de María Teresa Alejandra Diaz Figueroa, orientado pelo professor e doutor Cézar Henrique Barra Rocha, analisou dados disponíveis publicamente sobre a concentração dos metais pesados encontrados no Rio Paraibuna, entre 1997 e 2020, em cinco estações de monitoramento ao longo do rio.
Esgotos sem tratamento lançados diretamente no Rio Paraibuna
Wilson Acácio/Arquivo Pessoal
Os metais pesados são elementos químicos que podem se acumular no organismo e causar intoxicação, podendo até levar à morte, tanto em animais quanto em seres humanos. No corpo humano, eles causam problemas neurológicos, danos aos rins e fígado, doenças cardiovasculares, aumento do risco de doenças crônicas, câncer, entre outros.
Além disso, um estudo realizado por pesquisadores do Instituto de Ciências Biológicas e da Faculdade de Farmácia da UFJF identificou nove micropoluentes em amostras de água coletadas do Rio Paraibuna. A maioria consistia em produtos farmacêuticos, principalmente remédios utilizados no tratamento de doenças como diabete e hipertensão arterial.
A pesquisa ‘Variabilidade temporal e espacial de micropoluentes em um rio urbano tropical’ fez parte da tese de doutorado da pesquisadora Gabrielle Quadra, concluída em 2021 pelo Programa de Pós-Graduação em Biodiversidade e Conservação da Natureza da UFJF, em parceria com cientistas suecos.
De acordo com dados levantados pela companhia Brasil Health Service (BHS), um quilo de medicamento descartado via esgoto pode contaminar até 450 mil litros de água. Isso pode gerar inúmeros impactos no meio ambiente e, consequentemente, na saúde humana, como, por exemplo, efeitos terapêuticos ao indivíduo que consumir a água contaminada.
Como está a despoluição?
Assoreamento do Rio Paraibuna associado à poluição em Juiz de Fora
Wilson Acácio/Arquivo Pessoal
O desassoreamento do Rio Paraibuna é uma ação realizada sazonalmente pela Prefeitura e consiste na remoção de sedimentos, como areia, lodo e detritos, do rio. A medida busca aumentar a vazão dos cursos d’água durante o período chuvoso e, assim, prevenir enchentes e alagamentos.
Em 2024, o total de material retirado entre os períodos de 26 de agosto e 18 de outubro foi de 10.242 m³, ou seja, 3.660,079 toneladas de matéria, que foram encaminhadas ao aterro sanitário.
De acordo com a Prefeitura de Juiz de Fora, o projeto de despoluição do Rio Paraibuna e dos córregos da cidade continua sendo realizado pela Cesama.
“Tivemos como resultado um salto significativo no percentual de tratamento de esgoto desde 2021, de 7% para cerca de 50%”, afirmou a empresa em nota.
Atualmente, uma das frentes de trabalho está na Avenida Brasil, com a complementação do interceptor por meio de um método não-destrutivo, que irá transportar esgoto bruto para a Elevatória Independência e, posteriormente, para a ETE União-Indústria. Essa fase contempla o trecho entre a Rua Cesário Alvim e o viaduto Augusto Franco e, no total, serão 881 metros de interceptores de esgoto, incluindo a travessia no Rio Paraibuna.
Paralelamente, a licitação para a complementação dos coletores de esgoto dos córregos São Pedro e Tapera, além da integração dos sistemas das Estações de Tratamento de Esgoto (ETEs) Barreira do Triunfo e Barbosa Lage, foi concluída. A Cesama aguarda a análise da documentação da empresa vencedora, por parte da Caixa Econômica Federal, para emitir a ordem de serviço inicial.
A licitação que prevê a construção da elevatória de esgoto Mariano Procópio também foi concluída e está na fase de assinatura do contrato.
No entanto, para o professor da UFJF e engenheiro civil Cézar Henrique Barra Rocha, o problema é complexo e requer uma despoluição completa das 156 sub-bacias hidrográficas que deságuam no Rio Paraibuna.
“Não adianta despoluir apenas nas margens, interceptando o que chega dos dois lados ou recolhendo os lixos, se os afluentes chegam na maioria com esgoto puro, devido à ineficiência na despoluição dessas sub-bacias”, afirmou.
Cézar explicou que muitos córregos canalizados na cidade não conseguem separar as águas de esgoto das águas pluviais, como o Ribeirão Young, Matirumbide (Manoel Honório), Humaitá (Bairro Industrial), Ipiranga, entre outros. Para o professor, o ideal seria tratar todos os córregos, como é feito na Lagoa da Pampulha, em Belo Horizonte.
“Juiz de Fora deveria ter mais Estações de Tratamento de Esgoto (ETE) espalhadas pela foz de cada um desses principais córregos, em vez de apenas uma grande, como a União-Indústria, na divisa com Matias Barbosa. ETEs com redes menores são mais fáceis de gerenciar, inclusive em termos de vazamentos e perdas”, concluiu o engenheiro.
Águas do Rio Paraibuna sofrem com seca e poluição em Juiz de Fora
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