
O disco de estreia do Planet Hemp, Usuário, completou 30 anos em 2025.
Não são todas as bandas que sobrevivem ao teste do tempo e são capazes de se reinventar, mas essa conseguiu. Com temáticas ainda tão atuais, ela mesclou diferentes gêneros, causou mobilizações no debate público sobre a descriminalização da maconha e inspirou novas gerações de artistas brasileiros.
O grupo carioca rapidamente se aperfeiçoou na arte de fazer o que chamou de raprocknrollpsicodeliahardcoreragga, termo que nomeia a união de hip-hop, rock e muita erva. Também encontrou facilidade em bater de frente com o conservadorismo do Brasil dos anos 1990, o que acarretou em censura, desprezo por parte de alguns veículos midiáticos e até na prisão de seus membros.
Lançado no dia 22 de março de 1995, Usuário vendeu mais de 140 mil cópias e recebeu o certificado de Ouro. Na época, a banda contava com a formação de Marcelo D2 e BNegão (vocais), Rafael Crespo (guitarra), Formigão (baixo) e Bacalhau (bateria). O disco ainda teve a participação ilustre do rapper Black Alien e do DJ Zegon. Era o começo de um movimento que duraria até hoje.
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O início da fumaça
Tudo começou em 1992, com um encontro entre Marcelo D2 e Skunk orquestrado pelo acaso. O primeiro era um ambulante que vendia camisetas de bandas de rock no bairro do Catete, o segundo era apaixonado por música e tinha muita lábia. Papo vai, papo vem, e a ideia de formar uma banda surge com um obstáculo: nenhum dos dois sabia tocar algum instrumento.
O jeito foi investir no rap.
Porém, a sonoridade do grupo logo se tornaria mais diversa com a chegada de Rafael, Formigão e Bacalhau. Misturando riffs de guitarra hipnóticos, uma bateria intensa e versos politizados, o Planet Hemp começou a se aventurar pelo som que mais tarde se tornaria sua marca registrada.
O primeiro show da banda aconteceu no dia 24 de julho de 1993, na Garage, famosa casa de shows da cena underground. O repertório contou com músicas compostas durante os ensaios e que mais tarde entraram na tracklist de Usuário, como “Phunky Budda”, “A Culpa é de Quem?” e “Futuro do País”.
As origens do Planet Hemp chegaram a ser retratadas no filme Legalize Já: Amizade Nunca Morre, lançado nos cinemas em 2018 e dirigido por Johnny Araújo e Gustavo Bonafé. O longa se atém à relação entre D2 e Skunk e os desafios que enfrentaram nesse período.
Em 1994, a morte do vocalista Skunk por complicações da AIDS abalou os membros e quase fez com que desistissem do grupo. BNegão, que já acompanhava a banda em alguns shows, assumiu como vocalista. A banda assinou um contrato com a Sony Music e deu início à produção do primeiro álbum.
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“Usuário” censurado
Se em 2025 a descriminalização da maconha é um tópico sensível para alguns, em 1995 era assunto proibido para outros. Em Usuário, o Planet Hemp não teve medo de compor letras de denúncia sobre desigualdade social (“A Culpa É de Quem”), violência policial (“Porcos Fardados”) e racismo (“Muthafuckin’ Racists”). Mas isso teve um preço.
O clipe do primeiro single do disco, “Legalize Já”, gerou polêmica ao exibir uma criança regando um pé de maconha. Na época, a MTV passou a exibi-lo só depois das 23h. Segundo Pedro de Luna, autor da biografia Planet Hemp: Mantenha o Respeito, a emissora enviou o vídeo ao Ministério da Justiça, que determinou a restrição.
De acordo com D2, o grupo precisou cancelar apresentações na época devido à repressão ao conteúdo de suas músicas. Os membros chegaram a ser presos em 1997 após um show em Brasília, acusados de fazerem apologia ao crime.
O incômodo de setores mais conservadores se mantém até hoje. Em março de 2024, o prefeito de Criciúma (SC), Clésio Salvaro (PSD), ameaçou interromper um show do Planet Hemp no festival Urb Music Tour. O político publicou um vídeo em suas redes sociais afirmando que mandaria cortar a energia elétrica do local caso o grupo promovesse qualquer apologia às drogas durante a apresentação. Devido à ameaça, o festival alterou o local do show.
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Os 30 anos de Planet Hemp
Em comemoração ao aniversário especial, a banda gravou uma apresentação em julho de 2024, no Espaço Unimed, em São Paulo, para o DVD Baseado em Fatos Reais: 30 Anos de Fumaça. Além do retorno de Black Alien e DJ Zegon, a reunião contou com participações mais que especiais de Seu Jorge, Emicida, Criolo, Pitty, BaianaSystem, Major RD, Daniel Ganjaman, Apollo 9, Jacksom, Rodrigo Lima (Dead Fish), As Mercenárias, Mike Muir (Suicidal Tendencies) e Kamau.
As faixas de Usuário foram cantadas a plenos pulmões por um público de cerca de 7 mil pessoas, dentre elas muitos admiradores jovens. BNegão destacou o apelo da banda para as novas gerações e exaltou sua longevidade em um comunicado à imprensa:
“São 30 anos, mas a pressão sonora é a mesma – o Planet Hemp nunca foi só música; é uma ideia, uma mensagem que nunca deixou de ser atual.”
No dia 25 de junho de 2024, o Supremo Tribunal Federal decidiu descriminalizar o porte de maconha para consumo próprio. A decisão histórica fixou a quantidade de até 40 gramas para diferenciar usuários e traficantes. Se o Planet Hemp nos ensinou algo em todos esses anos, foi o poder da arte de influenciar o debate público sobre temas importantes. Mas também que é melhor plantar, e não comprar.
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