
Nos últimos dias, o mercado financeiro foi sacudido por um relatório da Grizzly Research, que acusa a XP Inc. de operar um esquema Ponzi, comparando suas práticas às fraudes bilionárias de Bernie Madoff. Segundo a Grizzly, os lucros da XP dependeriam de um ciclo vicioso sustentado pelo fundo Gladius e impulsionado pela venda agressiva de Certificados de Operações Estruturadas (COEs), caracterizando um modelo insustentável.
A denúncia gerou forte repercussão, impactando a cotação das ações da XP e levantando questionamentos sobre a solidez da empresa. No entanto, ao analisarmos essa acusação com maior rigor técnico e jurídico, surgem dúvidas sobre a credibilidade da Grizzly Research, inconsistências metodológicas e uma possível interpretação distorcida dos dados financeiros da XP.
Neste artigo, assumimos uma perspectiva crítica e de defesa, examinando ponto a ponto as alegações da Grizzly Research e contrapondo-as com fatos concretos, dados públicos e argumentos jurídicos sólidos. Investigamos o histórico da Grizzly e seus potenciais conflitos de interesse, confrontamos as acusações com os balanços auditados da XP e explicamos por que o caso não se encaixa na definição legal de pirâmide financeira. Além disso, discutimos os impactos do relatório para o mercado, reguladores e investidores.
Diante das evidências analisadas, questionamos se a denúncia da Grizzly representa um alerta legítimo ou se se trata de mais um relatório sensacionalista de short sellers, cujo real objetivo pode ser a manipulação do mercado em benefício próprio.
Credibilidade da Grizzly Research
A Grizzly Research é uma firma de análise conhecida por atuar como short seller – ou seja, toma posições vendidas em empresas e depois publica relatórios críticos. Isso por si só já levanta conflito de interesse, pois a empresa lucra se as ações caírem após suas denúncias. O histórico da Grizzly mostra casos controversos: em 2019, por exemplo, a companhia de cannabis Trulieve processou a Grizzly por difamação, alegando que o relatório publicado continha afirmações falsas e não comprovadas, disseminadas para manipular o preço das ações em benefício próprio. Outro caso ocorreu em 2021, quando a Peak Fintech refutou um relatório da Grizzly que a acusava de irregularidades, classificando-o como “infundado e irresponsável” e afirmando que as alegações eram “nada além de mentiras e fabricações” (Peak Fintech Group Inc.: Exhibit 99.257 – Filed by newsfilecorp.com). Nesse comunicado, a Peak Fintech destacou o disclaimer do próprio relatório da Grizzly, no qual a casa admite que seus relatórios expressam opiniões, não fatos (Peak Fintech Group Inc.: Exhibit 99.257 – Filed by newsfilecorp.com). Esses precedentes sugerem que as denúncias da Grizzly devem ser vistas com cautela, pois nem sempre se sustentam quando escrutinadas de perto. Em suma, a credibilidade da Grizzly Research é questionável: seu modelo de negócio cria incentivos para exagerar problemas e há exemplos concretos de alegações não confirmadas e desafios legais contra a empresa, o que enfraquece a confiabilidade de seus relatórios sensacionalistas.
Comparação com dados públicos da XP
Uma defesa sólida da XP Inc. passa por confrontar as alegações da Grizzly com os dados financeiros oficiais e informações disponíveis ao mercado. A XP é uma companhia de capital aberto, sujeita à auditoria independente e à supervisão de órgãos como CVM (Brasil) e SEC (EUA). Seus balanços e comunicados recentes contam uma história bem diferente da apresentada pela Grizzly. Em 2024, por exemplo, a XP divulgou resultados robustos: a receita anual cresceu cerca de 15%, atingindo R$ 18 bilhões, e o lucro líquido ajustado alcançou R$ 4,5 bilhões, um aumento de 17% em relação ao ano anterior. Esses números indicam uma empresa com crescimento saudável e lucratividade consistente, incompatíveis com a tese de insolvência mascarada que caracteriza esquemas Ponzi.
Além disso, dados públicos sugerem explicações alternativas plausíveis para pontos levantados no relatório. Dois fundos geridos pela XP – Gladius FIM CP IE e Coliseu FIM CP IE – tiveram desempenhos extraordinários nos últimos anos, o que a Grizzly caracteriza como “retornos anômalos”. Contudo, uma análise técnica mostra que tais retornos podem decorrer de estratégias contábeis e operacionais legais, e não de fraude. A própria corretora Ativa Investimentos, concorrente direta da XP, saiu em defesa da empresa destacando que esses fundos funcionam como ferramentas contábeis para otimização tributária (Concorrente da XP, Ativa, sai em defesa da corretora nas acusações). Graças a estruturas como o Gladius e Coliseu, a XP conseguiu reduzir sua alíquota efetiva de imposto para cerca de 1% em 2023 (quando a taxa nominal seria 34%), através de um planejamento tributário dentro da lei (Concorrente da XP, Ativa, sai em defesa da corretora nas acusações). Em outras palavras, parte da rentabilidade elevada do fundo Gladius pode ser atribuída a benefícios fiscais e à contabilização de resultados de market making (provisionamento de liquidez) em um veículo separado – prática permitida e comum no mercado brasileiro, ainda que em magnitude menor em outras instituições.
Importante notar também que a Grizzly aparenta ter cometido erros de interpretação de dados públicos. A Ativa ressalta que o relatório confundiu conceitos ao comparar R$ 167 bilhões de ativos sob gestão da XP Asset com R$ 1,08 trilhão de ativos sob custódia da XP como um todo (Concorrente da XP, Ativa, sai em defesa da corretora nas acusações). Essa comparação é incorreta – ativos sob custódia incluem todos os investimentos dos clientes na plataforma, enquanto ativos sob gestão referem-se apenas aos fundos geridos pela própria XP. Ao misturar esses números, o relatório pode ter inflado indevidamente a impressão de discrepâncias. Quando analisados corretamente, os indicadores da XP mostram coerência interna. Por exemplo, a rentabilidade sobre ativos (ROA) da XP está em torno de 1%, condizente com uma receita anual na casa de R$ 11 bilhões, o que “está em linha” com o esperado para o porte da empresa. Esses dados contrariam a tese de que os lucros da XP seriam impossíveis sem artifícios ilegais – na verdade, os resultados demonstrados estão alinhados com a performance de uma instituição financeira eficiente e bem administrada.
Outro ponto é que a XP atua majoritariamente como custodiante e distribuidora de produtos financeiros, e não como gestora de todos os recursos investidos pelos clientes. Isso significa que grande parte do dinheiro que circula na XP pertence a produtos emitidos por terceiros (títulos públicos, ações, fundos de outras gestoras etc.), não entrando no balanço como receita própria. O risco de crédito da XP recai mais sobre produtos que ela mesma estrutura (como COEs) do que sobre os investimentos de clientes em geral. Portanto, a sugestão de um “colapso” generalizado prejudicando todos os investidores da XP carece de embasamento, já que os ativos dos clientes estão segregados e protegidos pelas regras de custódia. Em resumo, os números públicos e fatos concretos dão suporte à versão da XP: a empresa mostra crescimento orgânico, estratégias agressivas (mas legais) de operação e tributação, e resultados compatíveis com seu modelo de negócios, sem necessidade de recorrer a esquemas fraudulentos.
Argumentação jurídica sobre a acusação de Ponzi
Para contestar tecnicamente a acusação de que a XP opera um esquema Ponzi, é crucial esclarecer o que caracteriza legalmente uma pirâmide financeira e verificar se a situação da XP se enquadra nesses critérios. Na legislação brasileira, esquemas desse tipo são considerados crime contra a economia popular. O Artigo 2º, inciso IX, da Lei 1.521/1951 define como crime a ação de “obter ou tentar obter ganhos ilícitos em detrimento do povo ou de número indeterminado de pessoas mediante especulações ou processos fraudulentos (‘bola de neve’, ‘cadeias’, ‘pichardismo’ e quaisquer outros equivalentes)”. Em termos simples, um esquema Ponzi (ou pirâmide financeira) é uma fraude em que os pagamentos ou lucros dos investidores mais antigos são financiados pelo dinheiro aportado por novos investidores, sem que exista uma atividade econômica real gerando esses retornos. Assim, quando o ingresso de novos participantes inevitavelmente diminui, o esquema entra em colapso, deixando prejuízo generalizado. Esse modus operandi clássico foi o do caso Bernard Madoff, citado pela Grizzly, e de diversos golpes financeiros que prometem rentabilidades exorbitantes sem sustentação em ativos ou negócios legítimos.
Diante dessa definição, a situação da XP deve ser analisada sob dois aspectos: (1) origem dos lucros e (2) sustentabilidade/lastro das operações. A Grizzly alega que os lucros da XP provêm majoritariamente de um “ciclo” alimentado por novos recursos de clientes (via COEs) e repassados para o fundo Gladius, em vez de serem frutos de operações genuínas no mercado. Se isso fosse verdade, estaríamos diante de um esquema altamente irregular. Entretanto, para que tal acusação se sustente juridicamente, seria necessário demonstrar fraude contábil deliberada – ou seja, que a XP estaria mascarando aportes de novos investidores como se fossem lucros de investimentos ou serviços.
Até o momento, não há evidências comprovadas de que a XP esteja incorrendo nesse tipo de fraude. Pelo contrário, a XP afirma categoricamente que cumpre todas as leis e normas regulatórias, com fiscalização da CVM, do Banco Central e da SEC, e que suas operações são auditadas regularmente por auditorias independentes. Caso a XP estivesse realmente operando uma pirâmide financeira de grandes proporções, é de se esperar que red flags (sinais de alerta) já tivessem sido percebidos por essas instâncias de controle. Empresas listadas em bolsa passam por auditorias frequentes e precisam divulgar demonstrações financeiras detalhadas. Qualquer inconsistência significativa – como passivos ocultos ou ingresso de recursos incompatíveis com os produtos vendidos – chamaria atenção de auditores profissionais, que têm dever legal de reportar irregularidades. Além disso, a própria estrutura de negócios da XP difere radicalmente de uma pirâmide tradicional. A XP oferece produtos e serviços financeiros reais: intermediação de investimentos, distribuição de fundos, oferta de títulos, assessoria financeira, entre outros. Seus clientes adquirem ativos (por exemplo, um COE, uma ação, uma cota de fundo) esperando um retorno desses investimentos, e não pagamento garantido vindo de outros participantes. Ou seja, há atividade econômica subjacente – ainda que parte dos ganhos da XP venha de margens nesses produtos, isso é muito distinto de simplesmente usar o dinheiro de novos clientes para pagar juros ou resgates de clientes antigos sem nenhuma operação por trás.
Outro ponto técnico é que, no caso de COEs e dos fundos em questão, os investidores não estão colocando dinheiro diretamente na XP esperando retornos dela, mas sim investindo em estruturas financeiras reguladas, com emissores, prazos e condições contratuais. Se a XP lucra ao intermediar ou estruturar esses produtos, isso configura receita de prestação de serviços ou resultado de operação de mercado, atividades previstas dentro da legalidade, e não um fluxo ilícito. Para alegar que isso é Ponzi, seria necessário provar que a XP enganou os investidores sobre a natureza do produto ou sobre os riscos, ou que estava insolvendo progressivamente (usando o dinheiro de uns para cobrir obrigações com outros). Nada nos balanços públicos indica insolvência oculta; a XP não apresenta passivos desproporcionais ou rombo financeiro – ao contrário, exibe patrimônio líquido robusto e adequação de capital, por mais que moralmente reputo o COE como um péssimo investimento na maioria das vezes.
No âmbito jurídico-regulatório, a classificação de um esquema como pirâmide também demanda intenção dolosa de fraude. A XP, sendo uma instituição estabelecida, estaria arriscando não apenas seu negócio mas a liberdade de seus executivos se deliberadamente conduzisse um esquema fraudulento desse tipo. É mais razoável interpretar a situação como um caso de estratégia empresarial agressiva porém lícita – possivelmente questionável em termos éticos ou de sustentabilidade de longo prazo, mas não criminosa. Inclusive, a própria concorrente Ativa reconheceu que não há indícios de crime, embora a XP efetivamente se apoie em produtos de alta margem (como COEs) para manter sua rentabilidade. Em síntese, do ponto de vista técnico e legal, faltam elementos para enquadrar a XP em “pirâmide financeira”. A empresa possui atividades reais geradoras de receita, está submetida a escrutínio regulatório rigoroso e suas demonstrações não revelam o padrão de colapso iminente típico de um esquema Ponzi. Enquanto não surgirem provas concretas de fraude – e não meras coincidências numéricas ou rumores de ex-funcionários – a acusação deve ser vista com extrema reserva.
Possíveis falhas metodológicas no relatório da Grizzly
Ao dissecar o relatório da Grizzly Research, emergem diversas fragilidades metodológicas que enfraquecem suas conclusões. Vale destacar alguns pontos em que a abordagem da Grizzly parece apresentar viés, omissões ou interpretações questionáveis dos dados:
- Viés de interesse e conclusões pré-determinadas: A Grizzly assumiu publicamente estar vendida (short) nas ações da XP, o que significa que tinha incentivo financeiro para derrubar a cotação. Isso lança dúvida sobre sua imparcialidade. O histórico da empresa indica que busca evidenciar o pior cenário possível nas empresas alvo. No caso da XP, a linguagem usada – chamando o fundo Gladius de “esquema Ponzi à la Madoff” – sugere um sensacionalismo que pode ter sido empregado para causar pânico entre os investidores. Essa postura tende a ignorar explicações convencionais, já que o objetivo aparente é sustentar a tese negativa para lucrar com ela. Inclusive, outras empresas já acusaram a Grizzly de fabricar alegações para benefício próprio, e a Peak Fintech chegou a afirmar que o relatório da Grizzly continha “apenas mentiras e fabricações”, possivelmente publicadas para cobrir posições vendidas (Peak Fintech Group Inc.: Exhibit 99.257 – Filed by newsfilecorp.com). Ou seja, há indícios de preconceito deliberado na análise – a Grizzly pode ter começado pela conclusão (XP é uma fraude) e selecionado/interpretado os dados para apoiar essa narrativa.
- Erros e comparações inadequadas de dados: O relatório apresenta números e comparações que, à primeira vista, chocam, mas que não resistem a uma verificação cuidadosa. Um exemplo claro é a comparação dos ativos sob gestão da XP Asset (R$ 167 bi) com os ativos totais sob custódia na XP (R$ 1,08 tri), como se fossem a mesma coisa (Concorrente da XP, Ativa, sai em defesa da corretora nas acusações). Essa equiparação é metodologicamente falha – seria equivalente a comparar maçãs com laranjas – e leva a uma interpretação errônea de que “faltariam” recursos para justificar os ganhos. Ao cometer esse deslize básico, o relatório levanta suspeitas sobre sua rigorosidade na análise de balanços. Outra possível omissão é não considerar devidamente o efeito tributário e regulatório no desempenho dos fundos Gladius e Coliseu. Conforme citado, esses fundos permitiram à XP reduzir drasticamente a carga tributária em certas operações, o que explica resultados líquidos muito acima do normal, sem recorrer a fraude (Concorrente da XP, Ativa, sai em defesa da corretora nas acusações). Ignorar essa explicação alternativa e legítima constitui uma falha metodológica ou, no mínimo, viés de confirmação, onde se descarta o que não encaixa na tese predeterminada.
- Dependência de fontes anônimas e falta de evidências verificáveis: Grande parte das acusações graves no relatório da Grizzly baseia-se em depoimentos de ex-funcionários e pessoas não identificadas. O texto afirma que insiders teriam confirmado a natureza de esquema Ponzi do fundo Gladius. No entanto, tais alegações não são acompanhadas de provas documentais robustas – não há e-mails, relatórios de auditoria, demonstrativos contábeis adulterados ou qualquer evidência concreta apresentada que comprove a fraude. Depoimentos anônimos, por mais sérios que possam soar, carecem de credibilidade se não forem corroborados por fatos objetivos. Aqui, a metodologia peca por se apoiar excessivamente em rumores e whistleblowers não identificados, sem permitir ao leitor ou às autoridades verificar a veracidade dessas informações. Além disso, a XP afirma jamais ter sido contatada pela Grizzly para esclarecer os pontos antes da publicação – um procedimento básico em relatórios responsáveis seria confrontar a empresa com os achados, dando chance de explicação ou defesa, o que aparentemente não ocorreu.
- Interpretações forçadas e linguagem subjetiva: Ao longo do relatório, a Grizzly usa termos como “inacreditavelmente altos”, “impossível de replicar” ou analogias com fraudes famosas para descrever os retornos da XP, em vez de demonstrar calmamente por que tais retornos seriam matematicamente inviáveis. Essa escolha de linguagem indica falta de neutralidade e possivelmente uma tentativa de influenciar emocionalmente o leitor. Uma análise verdadeiramente técnica teria comparado detalhadamente a composição das carteiras, as estratégias de hedge, ou até mesmo simulações quantitativas para demonstrar inconsistências – nada disso foi apresentado de forma transparente. A ausência de uma explicação quantitativa sólida (por exemplo, mostrando que o volume de COEs vendidos não bate com o lucro registrado, de forma irrefutável) é uma lacuna metodológica importante. O relatório menciona números impressionantes – como o suposto pagamento de R$ 11,16 bilhões dos fundos para a XP em 2024 – e conclui que seriam “irreais” frente ao mercado de COEs no Brasil. Contudo, não considera cenários alternativos, como a possibilidade de parte desse valor se referir a ganhos de trading legítimos ou reaproveitamento de capital dentro do próprio grupo XP. Em suma, a metodologia empregada parece mais voltada a persuadir do que a provar. Ao identificar vieses, erros de comparação, falta de evidências concretas e uso de linguagem carregada, percebe-se que o relatório carece do rigor esperado em uma denúncia dessa gravidade.
Impacto regulatório e de mercado
As acusações explosivas da Grizzly Research tiveram efeito imediato no mercado, mas é preciso separar o que pode ser exagero sensacionalista do que representa um risco real para investidores e para a empresa. No dia da divulgação do relatório, as ações da XP chegaram a cair cerca de 5% tanto na Nasdaq quanto na B3, refletindo a reação inicial de medo dos investidores. Movimentos assim não são incomuns diante de relatórios de short sellers, já que a incerteza leva a vendas precipitadas. Contudo, é importante analisar friamente os desdobramentos. A XP reagiu prontamente, classificando as alegações como “infundadas, falsas e incorretas” e anunciando que tomará medidas legais cabíveis contra a Grizzly. Essa resposta firme sugere confiança por parte da XP na legitimidade de suas operações – afinal, ao acionar a Justiça, a empresa se abre a um escrutínio ainda maior, o que não faria sentido se realmente estivesse cometendo fraude. Do lado dos reguladores, tanto a CVM (no Brasil) quanto a SEC (nos EUA) certamente acompanham casos assim. Até o momento, não houve nenhum comunicado de investigação formal anunciado por esses órgãos específico sobre a XP. Isso indica que, embora o relatório seja sério o suficiente para merecer atenção, ele ainda não provê evidências concretas que acionem de imediato uma intervenção regulatória.
Dito isso, cabe reconhecer que denúncias desse tipo podem sim motivar um maior escrutínio regulatório no futuro. A própria análise da Ativa menciona que, com a exposição pública dos métodos contábeis da XP, pode crescer a pressão por investigações sobre, por exemplo, sua baixíssima taxa de tributação efetiva e o uso intenso de COEs. Esse escrutínio não é algo negativo – na verdade, serve para dar transparência e, se for o caso, ajustar práticas que embora legais, talvez precisem de maior disclosure ou mesmo regulamentação específica (como regras sobre venda de produtos complexos a investidores de varejo). Porém, é fundamental distinguir isso de acusar a empresa de crime. Até aqui, o impacto parece mais reputacional do que estrutural: alguns investidores podem ter reduzido posição por precaução, e a XP precisará redobrar esforços de comunicação e transparência para reconquistar a confiança abalada momentaneamente.
Vale também apontar que a acusação de “esquema Ponzi” tem um peso quase sensacionalista. Em termos de mercado, classificações exageradas podem causar pânico desproporcional. Muitos investidores lembram do caso Madoff e, ao ouvir analogias, podem reagir emocionalmente. A defesa da XP é justamente no sentido de esclarecer o exagero: a empresa enfatiza que segue “todas as normas estabelecidas por órgãos reguladores, como CVM, SEC e Banco Central” e que seus números passam por auditorias independentes rigorosas. Isso traz um contraponto racional ao temor. Além disso, participantes experientes do mercado sabem que short sellers frequentemente pintam cenários piores para maximizar ganhos de curto prazo. Houve casos recentes em que relatórios similares derrubaram ações num primeiro momento, mas acabaram descreditados posteriormente, com as cotações se recuperando quando as inconsistências vieram à tona.
Para os investidores da XP, o evento serve de alerta para acompanhar mais de perto a empresa, mas não há indicativos de que devam entrar em pânico. Até que fatos objetivos comprovem irregularidades, é prudente analisar os fundamentos: a XP continua a apresentar crescimento de clientes, expansão de receita e lucro, além de estar inserida em um setor altamente regulado. O relatório da Grizzly, ao que tudo indica, fornece mais barulho do que sinal. Se alguma fragilidade real existir – por exemplo, risco de uma eventual mudança tributária que elimine os benefícios hoje obtidos – isso deve ser monitorado e precificado adequadamente, mas está longe de configurar fraude sistêmica. Em conclusão, há fortes indícios de exagero e sensacionalismo nas acusações.
O impacto de mercado, embora inicialmente significativo, tende a ser temporário caso a XP comprove, como argumenta, a lisura de seus resultados. Do ponto de vista regulatório, a publicação pode até catalisar auditorias extras ou pedidos de esclarecimento, mas, se a empresa realmente estiver em conformidade, o desfecho provável será o reforço da confiança dos investidores e do mercado na robustez e transparência da XP.
*artigo de Artêmio Picanço advogados associados OAB/GO 29.412 OAB/SP 439.412 OA/Portugal 67.584C
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