
Em meio aos desafios do pós-pandemia e à nova escalada das tensões comerciais globais, o mercado financeiro dos Estados Unidos começa a olhar com atenção renovada para uma estratégia alternativa de equilíbrio macroeconômico: o plano 3-3-3 de Scott Bessent, atual secretário do Tesouro dos EUA.
Embora não faça parte da política formal do Federal Reserve, o plano vem sendo amplamente discutido entre gestores, analistas e estrategistas como uma espécie de “âncora mental” para o reequilíbrio da economia americana após o choque inflacionário dos últimos anos e a política monetária agressiva que se seguiu.
O grande atrativo da proposta de Bessent está na sua simplicidade pragmática: definir três metas macroeconômicas que, combinadas, busquem garantir estabilidade sem exigir sacrifícios extremos ou depender de estímulos artificiais como no passado.
Os três pilares do plano Bessent
O conceito central do plano gira em torno de três números:
- Juros básicos (Fed Funds) a 3%
Um patamar que Bessent considera neutro. Não tão alto a ponto de sufocar o crescimento econômico, mas suficientemente restritivo para manter a inflação sob controle e evitar excessos no mercado de crédito. - Inflação a 3%
Embora a meta formal do Federal Reserve permaneça em 2%, Bessent argumenta que, na prática, um patamar de 3% seria mais realista no atual ambiente global, que combina desglobalização, políticas industriais mais protecionistas e a pressão dos custos da transição energética. - PIB crescendo 3% ao ano
Um nível visto como saudável e sustentável para a economia americana. Permite geração de empregos consistente e manutenção da confiança dos investidores, sem criar desequilíbrios.
Segundo Bessent, a combinação desses três indicadores estabeleceria uma base sólida para um “pouso suave” da economia americana — evitando tanto a recessão quanto um superaquecimento que possa reacender a inflação.
Reação do mercado ao plano Bessent
Depois do impacto da pandemia e dos pacotes de estímulo que inflaram a liquidez global, a inflação disparou, forçando o Fed a promover sucessivos aumentos de juros, que levaram a taxa básica a níveis superiores a 5%. Com isso, os riscos de uma recessão técnica ganharam força, e o mercado financeiro começou a buscar alternativas para um reequilíbrio sustentável.
O plano 3-3-3, portanto, tem sido visto como uma ferramenta pragmática de orientação, ainda que informal, que ajuda a alinhar expectativas de investidores e formuladores de políticas públicas.
Além de aliviar as pressões sobre os mercados financeiros, a ideia abre espaço para uma política econômica que priorize estímulos produtivos — como investimentos em infraestrutura, inovação tecnológica e energia limpa — sem precisar voltar a depender de taxas de juros próximas de zero, como ocorreu por grande parte da década passada.
Um novo cenário global exige novos parâmetros
A proposta de Bessent também reflete uma percepção mais ampla de mudança estrutural no ambiente global. A redução da interdependência comercial entre as nações, marcada pelo aumento de tarifas — como as recentemente anunciadas pelo governo Trump — e as tensões geopolíticas em alta, aponta para um cenário de desglobalização parcial.
Nesse ambiente, o antigo tripé de inflação controlada abaixo de 2%, juros baixos e crescimento robusto, que vigorou por décadas, pode não ser mais sustentável. O 3-3-3 aparece, assim, como uma resposta pragmática às novas realidades econômicas.
Opinião do especialista
Na avaliação de Fábio Fares, especialista em análise macroeconômica, o cenário para a consolidação do plano 3-3-3 se tornou mais complexo após os últimos movimentos do governo e do Federal Reserve. Mas destaca que pode ser uma proposta viável.
“É um proposta ambiciosa, mas tecnicamente viável, especialmente se os EUA conseguirem reequilibrar o peso entre setor público e setor privado na economia.” destacou o analista.
Fábio também aponta qual é o maior entrave para esse plano: “o maior obstáculo para essa meta hoje é justamente o alto grau de dependência estatal, mais de 80% da geração de empregos recente veio de setores ligados ao governo, e mais de um terço do PIB tem como motor o gasto público.”
Para ele, a recente implementação de tarifas mais agressivas, anunciadas pela administração Trump, acabou sendo um gatilho relevante nesse contexto.
“A reação do mercado foi clara: bolsas caindo forte, juros longos recuando, dólar estável e petróleo em queda. Isso sinaliza uma reprecificação dos riscos, com o mercado antecipando menor crescimento à frente e, ao mesmo tempo, aceitando um dólar ainda forte por conta da confiança relativa nos EUA como porto seguro.” destaca Fabio Fares.
“O mercado até começou a precificar uma desaceleração mais forte no crescimento, o que seria, em teoria, favorável ao plano 3-3-3″, explica Fares. “Mas o discurso de Jerome Powell trouxe um freio de realidade importante: o Fed não vai se apressar em cortar juros enquanto houver o risco de repasses inflacionários vindos das tarifas.”
Ele também avalia que esse movimento, apesar de volátil, “abre espaço para o plano do Bessent ganhar tração“, já que um ambiente de menor crescimento e menor apetite por ativos de risco pode forçar um novo ciclo de reorganização fiscal e produtiva. Mas que o timing da retomada da produção interna, especialmente no setor de energia será um desafio a ser enfrentado.
“Os EUA têm capacidade de aumentar a oferta de petróleo e gás, mas isso leva tempo e exige alinhamento regulatório” aponta o especialista.
Fábio Fares também observa que a recente sinalização do presidente do Fed, Jerome Powell, adiciona um mais obstáculo relevante para a execução do plano 3-3-3. Segundo o especialista, a mensagem do Fed foi clara ao reconhecer que os impactos inflacionários das novas tarifas podem se estender mais do que o inicialmente previsto, o que reduz a probabilidade de cortes de juros no curto prazo.
“O presidente do Fed deixou claro que os efeitos inflacionários das tarifas podem ser mais persistentes do que o esperado e que é cedo para prever cortes de juros. Isso sinaliza que o Fed está disposto a esperar, mesmo diante da desaceleração. Essa postura mais conservadora da autoridade monetária torna o ambiente ainda mais desafiador para o Tesouro, já que reduz a margem para o plano 3-3-3 avançar com apoio da política monetária.“, avalia Fares.
Para ele, o cenário impõe um ritmo mais lento à convergência dos pilares do plano, exigindo que o governo mantenha o foco na produtividade e na reorganização interna da economia, mesmo sem a ajuda da política monetária expansionista.
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