Heathrow fechado: entenda como um só aeroporto pode afetar voos do mundo inteiro, inclusive no Brasil


Aeroporto internacional de Heathrow, em Londres, teve de cancelar todos os voos nesta sexta-feira (21) por conta de um apagão gerado por incêndio. Milhares de passageiros foram impactados. Fechamento do aeroporto de Heathrow, em Londres, impacta passageiros no mundo todo
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Uma pequena cidade no Vietnã, um hub local no sul do África, e até alguns voos no Brasil. O fechamento inédito nesta sexta-feira (21) do aeroporto de Heathrow, em Londres, o maior da Europa, provocou o chamado efeito dominó no transporte aéreo comercial, com atrasos e cancelamentos de voos com impactos no mundo inteiro, inclusive no Brasil.
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Quarto aeroporto mais movimentado do mundo —segundo, se considerados apenas passageiros internacionais— Heathrow é também um dos principais hubs mundiais, nome dado a aeroportos que atuam como ponto de conexão entre dezenas ou centenas de destinos nacionais ou mundiais. É o caso de aeroportos como os de Paris, Frankfurt, Atlanta, Singapura e Guarulhos.
Justamente a maior vantagem de um hub, a grande capacidade de conexão entre cidades e países, carrega também um efeito colateral: o poder de gerar efeitos globais imediatos em caso de imprevistos —desde atrasos pelo mau tempo até a interrupção de funcionamento do aeroporto, com cancelamentos em massa de de voos, como ocorreu nesta sexta na capital britânica.
Viajantes chegam ao aeroporto de Heathrow apesar do fechamento após incêndio
AP Photo/Kin Cheung
Impactos em cadeia
De acordo com a administração de Heathrow, 1.357 voos estavam previstos nesta sexta — 679 de chegada e 678 de saída. Embora o aeroporto tenha comunicado a volta dos voos, levará algum tempo até que todos o serviço retorne ao normal.
Entre os impactos em cadeia, estão:
A necessidade de reacomodação de milhares de passageiros que deixam de voar: em Heathrow, foram 145,8 mil passageiros potencialmente afetados, segundo dados da consultoria Cirium divulgados pela agência Reuters.
O ajuste na jornada de tripulações: pilotos e comissários têm um limite determinado de horas a trabalhar (o que varia de país para país), e precisam obrigatoriamente descansar;
O deslocamento de tripulantes até os aeroportos alternativos, fora das bases em que costumam atuar;
O desvio em massa de voos: 121 voos foram desviados de Heathrow nesta sexta para 50 aeroportos em 21 países, de acordo com o site de monitoramento de voos FlightRadar24. Eram aviões a caminho de Londres quando o aeroporto fechou.
No Brasil, pelo menos dois voos da Latam e um da British Airways foram afetados.
Especialistas em aviação ouvidos pelo g1 disseram que não há alternativa, no funcionamento atual da aviação civil, para evitar que o transporte aéreo não dependa tanto dos hubs. Mas afirmaram também achar que o episódio desta sexta-feira apresentou lições valiosas, como mudanças de protocolo e aeroportos secundários, que podem mitigar efeitos de imprevistos nesses grandes aeroportos.
“Os hubs se popularizaram porque com eles hoje podemos atender um número maior de cidades no mundo inteiro e de uma forma mais econômica. Não tem como escapar disso”, disse o professor de economia do transporte aéreo na Universidade Anhembi Morumbi e ex-diretor de relações institucionais da Azul, Adalberto Febeliano.
“Nós vivemos isso aqui no Brasil pelo menos duas vezes por ano. Quando tem uma tempestade em Congonhas ou em Brasília, um voo de Recife vai atrasar. Não há escapatória, porque a aviação civil é um sistema, um conjunto de coisas que atuam para um mesmo fim, e o hub faz parte desse sistema.”
Desafio
O desafio atual, para Febeliano, é que os hubs adquiriram uma sensibilidade maior que outros elementos da aviação por conta de fatores que vão desde o crescimento do número de passageiros aéreos até a falta de manutenção nesses grandes aeroportos.
Até a última atualização desta reportagem, autoridades londrinas diziam não saber o que causou o incêndio que gerou um apagão no Heathrow e, consequentemente, o cancelamento total dos voos. E o episódio gerou uma série de questionamentos sobre a dependência de um hub do tamanho do Heathrow de uma única fonte de energia.
A administradora do aeroporto afirmou, na sexta, que o gerador interno tem capacidade de dar conta da energia do aeroporto. No entanto, como houve um incêndio de grande proporção e de causas desconhecidas, a gestora achou que a decisão segura seria cancelar as operações.
Uma fonte do aeroporto ouvida pela rede britânica BBC afirmou que o Heathrow tem geradores e outras fontes de energia, mas que elas não seriam suficientes para cobrir a falta de energia por conta do incêndio na subestação.
“Este é um ponto muito estranho. Porque, na aviação, é preciso ter redundância para tudo. Não dá para grandes aeroportos terem uma única fonte de energia. O de Changi, em Singapura, por exemplo, tem um sistema redundante de alimentação ininterrupta, além de inúmeros geradores”, disse ao g1 Dany Oliveira, ex-diretor da Associação Internacional de Transporte Aéreo (Iata) no Brasil e ex-estrategista da Embraer.
Na sexta, a Iata criticou a administração do Heathrow, a quem acusou de falta de planejamento.
“O que me deixa mais assustado, e acho que isso foi um choque para todo mundo, é como um incêndio em uma subestação que nem é no aeroporto causa esse bloqueio total”, afirmou Oliveira.
Oliveira disse achar que a conclusão das investigações sobre o caso podem gerar um novo protocolo para hubs, já que, também em sua opinião, a aviação civil é hoje “impossível” sem esses tipo de aeroportos.
“É impossível do ponto de vista econômico um cenário em que a aviação não dependa tanto dos hubs. A chave é tornar os hubs mais modernos, sustentáveis e seguros. Eles têm de ter uma estrutura muito boa e manutenção constante”.
A última vez em que aeroportos europeus sofreram interrupções em tão grande escala foi em 2010, quando ocorreu uma nuvem de cinzas vulcânicas na Islândia, o que provocou o cancelamento de cerca de 100 mil voos.
Aeroportos secundários
Outra fator essencial para mitigar efeitos de falhas na operação de hubs, para o professor Adalberto Febeliano, é que cidades estratégicas para o transporte aéreo, como São Paulo, no Brasil, tenham aeroportos secundários que sirvam de apoio.
“Em Paris, por exemplo, há 14 aeroportos. Ao norte do (aeroporto) Charles de Gaulle (em Paris), há um aeroporto internacional com uma pista de mais de 3.000 metros que não tem nem terminal de passageiros, mas serve como uma espécie de reserva do Charles de Gaulle”, afirmou.
“Viracopos [em Campinas] foi uma redundância para Guarulhos, embora hoje não seja mais”.
No caso de Londres, já há aeroportos próximos que são grandes e puderam acomodar parte dos voos que já estavam no ar, como Paris, Madri e Irlanda. Mesmo assim, Febeliano acha que o estrago causado pelo apagão apenas no atraso em Heathrow vai levar muitos dias para ser consertado.
“No caso de Heathrow, não é fácil reacomodar todos esses passageiros. Será uma questão que ainda vai levar dias”, disse.
Cancelamento de voos
Incêndio que gerou apagão no aeroporto de Heathrow, em Londres, atinge estação de energia
Heathrow passou a maior parte desta sexta-feira (21) totalmente fechado por conta de um incêndio em uma estação de energia.
Todos os voos de chegada e saída foram cancelados até o início da noite, quando os primeiros aviões aterrissaram no Heathrow.
A administração do Heathrow pediu para que as pessoas que têm voos agendados para esta sexta no aeroporto não se dirijam ao local e, em vez disso, entrem em contato com a companhia aérea.
O fechamento também provocou um efeito cascata no resto do mundo e fez com que centenas de outros voos também fossem cancelados ou tivessem suas rotas alteradas. Ao longo da madrugada, voos dos Estados Unidos em direção à Europa tiveram de dar meia-volta no meio do trajeto e retornar ao ponto de partida.
O Heathrow é um dos aeroportos de duas pistas mais movimentados do mundo, com cerca de 1.300 decolagens e pousos combinados por dia. “O Heatrhow é um dos principais hubs do mundo”, disse o porta-voz do site FlightRadar 24, Ian Petchenik.
Aeroporto de Heathrow, em Londres, é fechado após incêndio em estação de energia
Reuters
O fogo que danificou as operações do Heathrow começou no início da madrugada em uma estação de energia nos arredores do aeroporto. Cerca de 70 bombeiros tiveram de ir ao local para conter as chamas.
Em registros feitos por moradores, é possível ver fumaça e muito fogo (veja abaixo) Residências e empresas também ficaram sem energia.
Fogo em estação de energia perto do aeroporto internacional de Heathrow, em Londres, que gerou apagão no aeroporto, em 21 de março de 2025.
Corpo de Bombeiros de Londres via AP
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